quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Se olho bem de frente pro rosto da vida posso ver no brilho dos seus olhos uma espinha de mentira, com se o lacrimejar entre as pálpebras fosse pretensiosamente delineado para ser o retrato vivo de um abismo. Aí penso. Um passo. Dois. Três e no quarto eu mesmo me empurro - meio sem querer mas querendo muito - me jogo no preto profundo da dramaturgia social. Lá no fundo penso no amor e em como seria bom gasta-lo sem culpa em todos os orifícios que me fossem permitidos. Lá no fundo penso em escalar o abismo de volta à luz, mas dentro de mim está aquela sensação de que o fundo é tanto para baixo, como para cima. Então penso que somos buracos. Buracos onde nós mesmo nos enfiamos, envergonhados sem realmente experimentar a real vergonha da beleza de ser quem somos. Lá no fundo do meu buraco eu me habito e no fundo da minha habitação estão as minhas vaidades, as minhas paixões e a minha loucura, que nada mais é que o resultado da soma das minhas vaidades com minhas paixões. De repente, caído no fundo do abismo, começo a me enxergar como eu realmente não sou: porque quanto mais fundo se vai, mais escondidos estamos perante nós mesmos, porque todo fundo é o mesmo fundo, e nele não se encontram particularidades, nele se encontram coletividades e até, quem sabe, Deus. Então quando me enxergo por completo, iluminado pelos meus próprios lustres, me vejo vermelho de tantas lágrimas de sangue derramadas por todos meus olhos que choram suas divinas dores. Eu não me encontro quando estou só, eu me encontro quando estou afim de mim mesmo. Quando me calo sinto o mundo acontecer no meu silêncio. E daí, quando minhas duas cascas se tocam, nasce o fedor que me faz sorrir, sofrer e escrever. Falando a verdade, eu não quero que uma multidão me ouça, basta apenas um: eu mesmo. Por fim, nesse abismo, penso que não quero nascer de novo, eu quero mesmo é morrer pela última vez e só.

Ao meu Trio de Anjos.